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Congresso Nacional Constituinte de 1890-1891

  • BR DFCD AC1891
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  • 1890 - 1891

Em Petrópolis, no dia 21 de dezembro de 1889, pouco mais de um mês após a Proclamação da República em 15 de novembro, reuniu-se uma comissão de cinco membros designada pelo Governo Provisório do Marechal Deodoro da Fonseca, por meio do Decreto n.° 29 de 1889, para elaborar o projeto da nova constituição republicana.

Os participantes da comissão - Joaquim Saldanha Marinho, na qualidade de presidente, Américo Brasiliense de Almeida Mello, na de vice-presidente, Antônio Luiz dos Santos Werneck, Francisco Rangel Pestana e José Antônio Pedreira de Magalhães Castro – eram juristas e republicanos históricos. O presidente Joaquim Saldanha Marinho encarregou os demais membros de elaborarem quatro anteprojetos de Constituição a serem discutidos e votados. No entanto, Francisco Rangel Pestana era a favor de um projeto coletivo, mas, sendo voto vencido, acabou colaborando com Joaquim Saldanha Marinho na elaboração de um anteprojeto, resultando, assim, em três anteprojetos de Constituição.

A Comissão dos Cinco ou Comissão de Petrópolis guiou-se pelo modelo constitucional norte-americano de república presidencial federalista em contraposição a uma corrente mais positivista, com tendência ao autoritarismo. Além disso, inspirou-se também nas constituições da Argentina e da Suíça. Os três anteprojetos acabaram sendo reunidos em uma única proposta que foi levada à revisão por Rui Barbosa. Em seguida, foi discutida com o quadro de ministro do governo e submetida à aprovação do chefe do Governo Provisório, Marechal Deodoro da Fonseca.

O Decreto n° 78-B, de 21 de dezembro de 1889, por sua vez, determinou que o pleito eleitoral destinado à escolha dos constituintes seria realizado no dia 15 de setembro de 1890 e que a Assembleia Nacional Constituinte iria reunir-se e iniciar seus trabalhos dois meses depois, em 15 de novembro de 1890.

Apesar de ter sido formulada com o objetivo de embasar os trabalhos da Assembleia Constituinte, à qual seria submetida, a Constituição aprovada entrava em vigor apenas na parte referente à determinação de que o Poder Legislativo seria exercido pelo Congresso Nacional, de forma bicameral: pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal. A nova Carta teve o cuidado de especificar que os dois ramos legislativos trabalhariam "separadamente", prevendo sessão conjunta apenas para apuração final da eleição para presidente da República.

Em 15 de setembro de 1890 realizaram-se eleições em todo país e, em 15 de novembro de 1890, a Assembleia Constituinte foi instalada, composta de 205 deputados (Minas Gerais com 37 cadeiras; Bahia e São Paulo, 22; Pernambuco e Rio de Janeiro, 17; Rio Grande do Sul, 16; Ceará e Distrito Federal, 10; Pará e Maranhão, 7; Alagoas, 6; Paraíba, 5; Piauí, Rio Grande do Norte, Sergipe, Paraná e Santa Catarina, 4; Goiás, 3; Amazonas, Espírito Santo e Mato Grosso, 2) e 63 senadores (3 representantes de cada Estado), representantes das diversas correntes políticas que haviam fundado a República (militares, profissionais liberais, juristas, médicos, engenheiros civis e militares, jornalistas e mesmo servidores públicos, entre outros).

O presidente eleito para comandar o Congresso Nacional foi o senador Prudente José de Morais Barros, de São Paulo, e que, mais tarde, iria tornar-se o primeiro presidente civil e o primeiro presidente por eleição direta no país. Formou-se uma nova comissão especial com 21 membros, conhecida como Comissão dos 21, para dar parecer sobre a Constituição provisória formulada pela Comissão de Petrópolis, composta por um representante de cada Estado (antigas províncias). O relator escolhido foi o deputado pelo Rio Grande do Sul, Júlio Castilho. Seu parecer foi entregue menos de um mês depois, em 10 de dezembro de 1890. O relatório focava na organização federativa, discriminação de rendas e autonomia financeira dos estados, unidade da aplicação do direito, instâncias da magistratura, sistema de eleição presidencial, qualificação dos eleitores aptos a exercerem seus direitos civis e políticos, liberdade religiosa, entre outros assuntos.

Os debates da Assembleia Nacional Constituinte foram marcados pela oposição entre dois grupos: os unionistas e os federalistas. O primeiro grupo era liderado pelo senador baiano Rui Barbosa e estava inclinado a um modelo federativo centralizado, com a concessão de maiores poderes à União. Já o segundo grupo era encabeçado pelos deputados gaúchos Júlio de Castilhos e Borges de Medeiros, além do senador paulista Campos Sales e do deputado catarinense Lauro Müller, favoráveis a conferir maior autonomia aos estados.

Ao final de 58 dias de trabalhos, o projeto foi apresentado, e em 24 de fevereiro de 1891, a segunda Constituição brasileira foi promulgada, a primeira do regime republicano. A Constituição elaborada resultou 91 artigos e 8 disposições transitórias.

A nova Carta Magna estabelecia:

  • separação de poderes: a separação dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, harmônicos e independentes entre si;

  • transformação de províncias em estados e Distrito Federal: a constituição das províncias em estados, e o estabelecimento do Município Neutro, o Distrito Federal, mantido como capital da União, cuja mudança ficava prevista para o Planalto Central;

  • recursos dos estados: provisão de recursos pelos estados por meio de seu governo e administração, cabendo à União prestar socorro em caso de calamidade pública, mas somente quando solicitada pelos governos estaduais (art. 5º);

  • autonomia aos estados: garantia de autonomia ao estados para fundirem-se, subdividirem-se ou desmembrarem-se, sob aprovação das respectivas assembleias legislativas e do Congresso Nacional (Título I, art. 4º);

  • intervenção federal: intervenção do governo federal nos estados somente em razão de invasão estrangeira ou de outro ente federado; para defesa da forma republicana federativa; para restabelecer a ordem e a tranquilidade, por solicitação dos respectivos governos; e para assegurar a execução das leis e sentenças federais (art. 6°);

  • competência exclusiva da União: competência da exclusiva da União sobre o estabelecimento de impostos sobre a importação de procedência estrangeira; direitos de entrada, saída e estada de navios, com a permissão de livre comércio de cabotagem às mercadorias nacionais, assim como às estrangeiras que tivessem pago imposto de importação; taxas dos correios e telégrafos federais; além da instituição de bancos emissores e da criação e manutenção de alfândegas (art. 7º);

  • impostos estaduais: foram definidos os impostos que deveriam ser decretados pelos estados, como os de exportação de mercadorias de sua própria produção, sobre imóveis rurais e urbanos, de transmissão de propriedade, e de indústrias e profissões (art. 9º). Os governos federal e estaduais ficavam impedidos de criar impostos de trânsito pelo território de um estado, ou na passagem de um para outro, sobre produtos de outros estados da República, ou estrangeiros, bem como sobre os veículos, de terra e água, que os transportassem;

  • Poder Legislativo: manteve-se o sistema bicameral exercido pelo Congresso Nacional, com a sanção do presidente da República. O Congresso compunha-se do Senado, representante dos estados, e da Câmara, representante do povo, cujos deputados seriam escolhidos, em eleições diretas e simultâneas em todo o país, pelos estados e Distrito Federal (art. 16). Cada legislatura teria duração de três anos, e Câmara dos Deputados e Senado trabalhariam separadamente, deliberando por maioria simples de votos, cabendo exclusivamente ao Congresso definir sobre a prorrogação e adiamento de suas sessões (art. 17);

  • número de deputados: fixado por lei, em proporção que não excedesse um por setenta mil habitantes, mas não devendo ser inferior a quatro por estado; os senadores seriam em quantidade de três por estado e Distrito Federal, eleitos da mesma forma que os deputados (art. 28, § 1, e art. 30). Eram condições de elegibilidade para o Congresso Nacional estar na posse dos direitos de cidadão brasileiro e ser alistável como eleitor, devendo possuir mais de quatro anos de cidadania brasileira para a Câmara, e mais de seis para o Senado;

  • imunidade parlamentar: deputados e senadores eram invioláveis por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato (art. 19), e não poderiam ser presos nem processados criminalmente sem prévia licença da Câmara, salvo caso de flagrante em crime inafiançável (art. 20);

  • vedações e desincompatibilização: os congressistas não poderiam celebrar contratos com o Poder Executivo, receber comissões ou exercer empregos remunerados, exceto nos casos previstos na Constituição, para o que deveriam ter licença prévia da Câmara, não podendo ainda ser presidentes ou fazer parte de diretorias de bancos, companhias ou empresas que gozassem dos favores do governo federal definidos em lei (art. 23 e 24). No caso de deputado ou senador aceitar o cargo de ministro, perderia o mandato, tendo que se proceder a nova eleição;

  • competências privativas da Câmara e do Senado: Câmara dos Deputados e Senado eram responsáveis por sua própria organização, por regular o serviço de sua polícia interna e nomear empregados de sua secretaria (art. 18). Competia privativamente à Câmara a iniciativa do adiamento da sessão legislativa e de todas as leis de impostos, das leis de fixação das forças de terra e mar, da discussão dos projetos oferecidos ao Poder Executivo, e a declaração da procedência ou improcedência da acusação contra o presidente da República e ministros de Estado (art. 29). O Senado respondia exclusivamente pelo julgamento do presidente da República e dos demais funcionários federais designados pela Constituição (art. 33);

  • Poder Executivo: seu exercício competia ao presidente da República, como chefe eletivo da nação, substituído em seus impedimentos ou ausências pelo vice-presidente, eleito simultaneamente com ele. Na falta deste, seriam sucessivamente chamados à presidência o vice-presidente do Senado, o presidente da Câmara e o do Supremo Tribunal Federal (art. 41, § 1º e 2º). A Constituição determinou que presidente e vice-presidente seriam eleitos por maioria absoluta de votos; se não fosse alcançada essa maioria, o Congresso elegeria, por maioria dos votos presentes, um deles, dentre os que tivessem alcançado as duas votações mais elevadas na eleição direta. Em caso de empate seria eleito o mais velho dos candidatos (art. 47);

  • mandato presidencial: para ser presidente era necessário ser maior de 35 anos (art. 41, §1° e 2°). O mandato presidencial seria de quatro anos, e o presidente e o vice-presidente receberiam subsídio fixado pelo Congresso no período presidencial antecedente (art. 43 e 46);

  • estado de sítio: quando a segurança da República exigisse, nos casos de agressão estrangeira ou comoção interna (art. 34, n. 21). Diante de “iminente perigo” e não se encontrando reunido o Congresso, o Poder Executivo poderia exercer a atribuição de declarar o estado de sítio (art. 48, n. 15; art. 80, § 1º);

  • ministros: a Constituição definia os ministros como auxiliares do presidente, agentes de sua confiança, subscrevendo-lhe os atos, cada um à frente de um ministério (art. 49). Não poderiam acumular outro emprego ou função pública, nem ser eleitos presidente ou vice-presidente da União, deputado ou senador. Os titulares dos ministérios apresentariam relatórios anuais ao presidente e não poderiam comparecer às sessões do Congresso, apenas às comissões das câmaras (art. 50 e 51);

  • Supremo Tribunal Federal: o Supremo Tribunal Federal seria composto por quinze juízes, escolhido entre os cidadãos de notável saber e reputação, maiores de 35 anos, devendo ter o nome aprovado pelo Senado. Os juízes federais seriam vitalícios e perderiam o cargo unicamente por sentença judicial. O presidente tinha o poder de designar, dentre os membros do STF, o procurador-geral da República (art. 48, § 12º, 56, 57, e 58, § 2º). O STF teria duas principais atribuições. A primeira seria o processo e julgamento, originário e privativo, do presidente da República, nos crimes comuns; dos ministros de Estado e diplomáticos, nos crimes comuns e de responsabilidade; das causas que envolvessem a União e estados, ou destes contra outros, as nações estrangeiras e a União ou os estados; e dos conflitos dos juízes ou tribunais federais entre si, ou entre estes e os estaduais (art. 59, I). A segunda atribuição seria o julgamento, em grau de recurso, das causas julgadas pelos juízes e tribunais federais; dos processos findos em matéria crime; das sentenças das justiças estaduais, em última instância, quando questionada a validade e vigência das leis federais; das leis ou atos dos governos estaduais em face da Constituição ou das leis federais (art. 59, II e III);

  • eleitores: maiores de 21 anos que se alistassem, estando impedidos de registrar-se, implicava em caso de perda dos direitos políticos. Estava vedado o alistamento eleitoral, para as eleições federais ou estaduais, aos mendigos, analfabetos e as praças de pré (militares de categoria inferior na hierarquia militar, em geral soldado e cabo), exceção feita aos alunos das escolas militares de ensino superior, e aos religiosos de congregações cujos membros se encontrassem sujeitos a regras que acarretassem a renúncia da liberdade individual. Ficavam inelegíveis os cidadãos não alistáveis (art. 70), o que também excluía as mulheres do direito de voto. Os direitos políticos dos cidadãos só seriam suspensos em caso de incapacidade física ou moral, ou de condenação criminal, enquanto durassem os seus efeitos. A perda do direito estava prevista por ocasião de naturalização estrangeira ou por aceitação de emprego ou pensão de governo estrangeiro, sem licença do Poder Executivo federal (art. 71);

  • direitos: assegurava a brasileiros e estrangeiros a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade; reafirmava a igualdade de todos perante a lei; garantia a liberdade de culto; declarava não admitir privilégio de nascimento e desconhecer foros de nobreza, extinguindo ordens honoríficas, títulos nobiliárquicos e de conselho; instituiu o casamento civil, secularizou os cemitérios, laicizou o ensino público e determinou que nenhum culto ou igreja receberia subvenção oficial; aboliu a pena de morte, a pena de galés (pena de trabalhos forçados) e a de banimento judicial; assegurou o direito de propriedade em toda a sua plenitude, salva a desapropriação por necessidade ou utilidade pública; criou o habeas corpus, em caso de risco iminente de violência ou coação, por ilegalidade ou abuso de poder (art. 72);

  • Supremo Tribunal Militar: a Constituição mantinha ainda o foro especial para militares de terra e mar nos delitos militares, composto de um Supremo Tribunal Militar, com membros vitalícios, e dos conselhos militares para a formação da culpa e julgamento dos crimes (art. 77);

  • Tribunal de Contas: com a função de verificar a legalidade das contas, antes de serem prestadas ao Congresso (art. 89);

  • disposições transitórias: trataram das regras para primeira eleição da República para presidente e vice-presidente dos Estados Unidos do Brasil; da exigência da elaboração e decreto das Constituições estaduais até 1892; das regras para as primeiras nomeações para magistratura federal e para os estados; da pensão que seria concedida ao ex-Imperador do Brasil, D. Pedro de Alcântara, a fim de que se garantisse sua subsistência até seu falecimento; da aquisição pela União da casa em que faleceu Benjamin Constant, fundador da República.

Desse modo, a nova Constituição de 1891 trouxe importantes mudanças, como a instituição de uma república federativa liberal, com sistema presidencialista de governo, adotou a divisão tripartite de poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – e extinguiu o Poder Moderador, conferiu grande autonomia aos estados-membros, determinou a separação entre Estado e Igreja, com a afirmação da laicidade do Estado e a liberdade religiosa, bem como o fim dos privilégios de nascimento e de foros de nobreza, e a igualdade perante a lei, com a ampliação das garantias individuais constantes da Constituição de 1824.

Ao mesmo tempo, em que a Constituição de 1891 trouxe tais mudanças, as tensões entre as diversas correntes republicanas e conflitos locais contribuíam para a instabilidade da Nação. As disputas ideológicas entre civis e militares, a crise financeira, a grande autonomia dos estados, as fraudes eleitorais, associada à exclusão política da maioria da população, fizeram com quem em 3 de novembro de 1891, o presidente Deodoro da Fonseca fechasse o Congresso e decretasse o primeiro estado de sítio após a promulgação da Constituição, utilizando-se da intervenção federal como instrumento para resolução de conflitos entre estados da federação e grupos oligárquicos. Até 1930, o estado de sítio seria decretado onze vezes: 1891, 1892, 1893, 1897, 1904, 1910, 1914, 1917/1918, 1922/1923, 1924/1926 e 1930.

Congresso Nacional Constituinte 1890-1891